Este artigo foi realizado em colaboração com Lawton Benatti, mentor do InovAtiva, reconhecido como Mentor Destaque no InovAtiva Experience 2024 e no Ciclo de aceleração InovAtiva 2025.
Professor por profissão e cozinheiro por paixão, co-fundador da Alere Ventures, com forte atuação no ecossistema mentorando e avaliando mais de 500 startups e projetos de inovação por ano.
Cenário do ecossistema de inovação
O cenário de startups é de incerteza em sua natureza, fruto da própria inovação e daquilo que ela proporciona. Nesta lógica, o mercado oscila e há momentos de altas e baixas. Mas existe uma certeza: nos próximos 1000 anos, é muito difícil imaginar uma sociedade sem iniciativas inovadoras. Assim, não há a menor dúvida que o ecossistema de inovação só vai crescer.
Agora, o que precisa analisar é para quais caminhos esse crescimento vai seguir. Não me limito aqui a dizer apenas sobre aquelas “trends” passageiras, mas sim o que de fato se consolida. Aqui vale a pena pensar em dois aspectos: estratégias e ferramentas.
Começando pelo mais simples, as tendências para as ferramentas se consolidam com o uso de IA e blockchain. No caso da IA, está cada vez mais tangível o seu uso cotidiano e, de fato, muitas soluções permitem seu uso. Para a blockchain, ainda é um pouco nebuloso para a sociedade entender como pode ser aplicada. Eu sempre penso que se aquele mercadinho de bairro está usando uma ferramenta ou uma tecnologia é porque ela já foi totalmente disseminada e, com o blockchain, mesmo consolidada como tendência, ainda precisa ser vista com maior aplicabilidade. Portanto, se você quer uma ideia de negócio, aproveite esse viés em simplificar o uso dessa ferramenta para sociedade e você vai ver o milagre de se tornar unicórnio.
Nas estratégias, a coisa é mais complexa, já que o conjunto de variáveis é muito amplo. Como dificultar o entendimento não vai ajudar em nada, vamos considerar um recorte de três variáveis entre muitas: tecnologia, público-alvo e capital.
Pensando na tecnologia, considerando inclusive o que a Y Combinator pensa como foco de atenção, soluções integradoras são sempre bem-vindas. Seja em formato SaaS ou API´s, a oferta de soluções que facilitam a integração tem muito espaço para atuação. Se conseguir oferecer soluções que permitam conversar entre diferentes formatos, bases de dados ou fontes, melhor ainda.
Quando falamos de público-alvo (ou segmentação para a galera mercadológica), é importante observar que a grande massa ainda enfrenta desafios no uso da tecnologia. Sejam idosos não familiarizados com as soluções tecnológicas ou, na outra ponta, jovens que passam 14 horas conectados no celular, mas enfrentam enormes desafios em elaborar uma planilha ou usar um scanner, o fato é que o “como fazer e como usar” deve ser um dos aspectos chave no desenvolvimento da solução. Entenda: a complexidade da solução tem que estar na arquitetura de dados, nunca na interface do usuário. Para a experiência do usuário, quanto mais simples e intuitivo, maior a aceitação. Se o mercado não entende sua solução, simplesmente não compra.
Observando o capital, nunca se imaginou tanto dinheiro disponível para startups, absolutamente diferente do cenário de 2022 e 2023 quando muita gente imaginou que a fonte havia secado. O “dry powder” nunca foi alto como agora, com fundos sentados no dinheiro na casa de bilhões aguardando oportunidades. O capital, de fato, não deixou de existir, mas sim direcionar para outros cenários e negócios. Prepare-se: a competição mudou. Se antes, bastava um Power Point e um discurso agradável para conseguir a captação, agora o foco se dá na validação de resultados. A régua para investimento está cada vez mais profissionalizada e a expectativa por resultados fica muito parecida com negócios da economia real. O Investidor hoje quer saber se a solução foi validada e se os esforços de vendas estão ocorrendo.
E agora? O que fazer?
Não vou mentir nem dourar a pílula: se você está esperando investimento para iniciar seu negócio, vai se frustrar. A recomendação é: foco em vendas, mesmo quando a tecnologia ainda não está disponível. É possível criar alternativas para vender antes de entregar: acordos comerciais, ofertas de serviços, participação no desenvolvimento, pré-negociações são algumas das alternativas. O investidor quer ver, no final das contas, como o empreendedor vai se comportar quando tudo der errado, já que ele precisa ter segurança na sua atuação.
Eu mentoro e avalio centenas de startups por ano e, na maior parte das vezes, empreendedores muito bons em termos técnicos ou mesmo tecnológicos acreditam que um bom produto já basta. Isso é especialmente observado nas deep techs que, de forma geral, envolvem gente muito inteligente e dedicada à pesquisa. Quando questionados sobre quantos clientes visitaram no último mês, a resposta é sempre frustrante. Mesmo que você seja da área técnica, é fundamental manter contato com o mercado, conversar com potenciais clientes, ver e ser visto. Esta é a maneira como você vai se aproximar de futuros compradores e, mais ainda, entender as necessidades e explorar oportunidades. Tem muita empresa com produto mediano em termos tecnológicos, mas campeão de vendas, justamente porque o empreendedor entendeu que essa aproximação faz parte do milagre.
Investidor quer confiar no empreendedor
Eu tenho a grata possibilidade de ter acesso a muita gente inteligente e que conhece bem o mercado e, conversando com diversos profissionais que fazem a difícil tarefa de calcular o valuation das startups, a unanimidade do fato “empreendedor” é gritante. A maioria absoluta dos profissionais afirma que, praticamente, metade do valuation está respaldado na capacidade do empreendedor de resolver problemas e enfrentar situações difíceis. Se o empreendedor não passar a confiança de resolver os problemas quando tudo der errado (porque, em algum momento, vai dar tudo errado durante a jornada), o investidor não vai embarcar no projeto. Por maior que seja a tese de investimento, o mercado, a solução ou a tecnologia, se o empreendedor não mostrar que está disposto a fazer o que precisa ser feito quando for demandado, o investimento não vai acontecer.
Sim, apenas lembrando, tudo isso depois que o investidor perceber que o empreendedor tem dedicação exclusiva, resiliência e está buscando se movimentar no mercado!
Relações humanas prevalecem
As conexões estabelecidas precisam subir o patamar. Existe uma grande chance de você estabelecer contatos periódicos no Linkedin ou nas redes sociais. É muito provável que você, ao participar dos eventos, troque cartões ou contatos com a galera. Isso tudo precisa ser feito, mas o esforço de tornar uma conexão em um relacionamento precisa acontecer. Você precisa subir um degrau no relacionamento e, aqui, vale o cuidado nas relações. Manter contato periódico, oferecer contrapartidas e contribuir no compartilhamento de informações ajuda muito.
Uma alternativa é dedicar espaço na sua agenda diária para relacionamento, de forma estratégica. Planejamento do propósito da conexão, o que pode oferecer como contrapartida e explorar quais as sinergias que podem ocorrer com este contato. Não se trata de transformar cada mensagem ou cada conversa em uma situação instagramável, mas sim construir bases de apoio para, quando necessário e aplicável, facilitar as conexões.
Eu dedico, em cada ciclo do InovAtiva, um espaço na minha agenda para manter contato com as startups participantes, seja na atuação como mentor, seja como um contato espontâneo. Essa dedicação, ainda que me tome tempo, permite que me aproxime de diferentes modelos de negócio e empreendedores. Os resultados, a longo prazo, já se tornaram negociações, contratos de serviços e participações com equity. Portanto, estimular as relações humanas nunca fez mal a ninguém e vale a pena.
Recado final: quanto antes validar, melhor
Startup precisa ter escalabilidade, velocidade e cultura, como defende meu amigo Thiago Bispo, também mentor do InovAtiva. Especificamente falando da velocidade, muita gente entende que precisa fazer as coisas com pressa, mas não é isso. O que precisa focar aqui é entender, o quanto antes, se o mercado de fato DESEJA sua solução. Isso envolve uma relação complexa que envolve o momento, o mercado, as expectativas e a proposta de valor oferecida que, o quanto antes, precisa ser validada. Lembre-se que a resposta negativa também é uma resposta.
Por este motivo preciso citar outro mentor do InovAtiva, André Ferreira que, em uma das sessões de demolation que estávamos juntos, ele citou uma frase particularmente interessante que me fez repensar muita coisa: para o mercado comprar a solução da sua startup, o que ele precisa mandar embora? Às vezes, seu cliente precisa mandar embora outros fornecedores que já tinham soluções consolidadas. Às vezes, precisam mandar embora práticas de mercado ou procedimentos que já estavam acostumados e que funcionam até então. Portanto, entender o que o mercado deseja é mais importante do que ter tudo pronto. Deixe o cliente te xingar, depois você ajusta a tecnologia!